quarta-feira, 29 de maio de 2019

Simplício Gago da Câmara e a agricultura micaelense


Simplício Gago da Câmara e a agricultura micaelense

Na semana passada dediquei o texto a Simplício Gago da Câmara, tendo mencionado, entre outros aspetos da sua vida, o seu contributo para a reflorestação da ilha de São Miguel. Neste texto, darei a conhecer o seu contributo para o desenvolvimento da agricultura.

Vila Franca do Campo foi um concelho com grandes quintas de laranjeiras, tendo a sua apanha sido magistralmente descrita pelos irmãos Joseph e Henry Bullar no seu livro “Um inverno nos Açores e um verão no Vale das Furnas”. Simplício Gago da Câmara foi, segundo Luís Arruda, produtor e exportador de laranja, tendo introduzido em São Miguel “a laranja dita sevilha, a partir de sementes obtidas em Londres”.

Simplício Gago da Câmara não era um mero produtor de laranjas, ou um agricultor passivo. Pelo contrário, tal como estudava muito sobre História Natural também observava com pormenor as plantações e experimentava. Assim, de acordo com um texto publicado no nº 7 d’O Agricultor Micaelense, verificando que possuía uma laranjeira enfezada que não reagia a qualquer tratamento resolveu “decotá-la para que rebentasse com mais força e que, traçando-a a meio do tronco, observara que o âmago estava todo negro, e azougado, o que não tinha dúvida de atribuir ao defeito proveniente da mergulhia”.

Na Gorreana, para além da plantação de matas com pinheiros, giestas e criptomérias, Simplício Gago da Câmara também cultivou chá e iniciou a sua industrialização.

Simplício Gago da Câmara foi produtor de vinho, a partir de videiras que possuía sobretudo no seu prédio do Convento. Para além dos terrenos do Convento, importa referir que depois de adquirir o ilhéu de Vila Franca do Campo, Simplício Gago da Câmara fez plantações de vinhas que perduram até ao século passado.

A criação de gado bovino também foi uma das atividades desenvolvidas por Simplício Gago da Câmara como se pode depreender de uma nota publicada no número dois d’ O Agricultor Micaelense. Com efeito, o autor do texto menciona o cultivo de beterraba que servia de alimento para os porcos, para os bois d’engorda, para as vacas de leite, para todos os animais” e acrescenta que “em Vila Franca o Sr. Simplício Gago está dando há mais de três meses, uma arroba de beterrabas por dia a cada um dos vários bois que prepara para o açougue e outro tanto às suas vacas e porcos, com o que têm medrado a olhos vistos..”

O cultivo do linho também foi experimentado por Simplício Gago da Câmara, como demonstra o relato de uma reunião da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense realizada 11 de dezembro de 1848. Assim, na reunião referida, presidida por José Jácome Correa, aquele expôs “uma amostra de linho com seis palmos de comprido, de semente originária de Riga”.

Simplício Gago da Câmara também se preocupou com o cultivo do trigo e com os trabalhos associados à debulha. Assim, de acordo com um texto publicado n’ O Agricultor Micaelense nº 7, ele introduziu “umas pequenas máquinas de debulhar, portáveis e movidas por dois homens”. Ainda no que diz respeito a maquinaria para aligeirar o trabalho no campo, é atribuída a Simplício Gago da Câmara uma máquina a vapor existente em São Miguel que era multifuncional, pois tanto servia para moer trigo ou milho como para serrar madeira.

Não sabemos se teve concretização, mas Simplício Gago da Câmara projetou a introdução de “um moinho de azeite, movido a vapor, e uma prensa hidráulica para a expressão do óleo”. De acordo com o texto publicado no primeiro número d’ O Agricultor Micaelense, “ a importante introdução a que aludimos será o mais forte incentivo e fomento de uma cultura abandonada entre nós [a produção de sementes oleaginosas] mas de incontestável e reconhecida vantagem entre os estranhos”.



Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31839, 30 de maio de 2019, p 13)

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