segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Sobre o livro de memórias do mestre Dinis


Sobre o livro de memórias do mestre Dinis

Foi com estranheza que pessoa conhecida me informou que o mestre Dinis, da Ribeira Seca de Vila Franca do Campo, havia escrito um livro que foi lançado durante as festas do Bom Jesus da Pedra. Tal facto só pode acontecer por parte de quem foi educado num sistema de ensino e numa sociedade que sobrevaloriza o trabalho intelectual e que menospreza o trabalho manual.

Sobre esta falsa dualidade, o professor Agostinho da Silva escreveu que se todos os homens pensam, então todos são intelectuais.

Relativamente aos que por terem decorado passagens de alguns livros enquanto andaram pelas escolas e universidades, convém lembrar que mais importante do que o saber livresco é a honestidade e o carácter e que, tal como escreveu Agostinho da Silva “, para uma pessoa se educar não é necessário haver escola, como instituição, sendo a melhor escola a escola da vida”.

Numa poesia sobre “A Educação” o mestre Dinis escreveu:

“Na vida se for credível
É porque tem honestidade
Assim será possível
Viver em sociedade”

Depois desta um pouco longa introdução, vamos dar a conhecer um pouco o mestre Diniz e o seu livro, ignorando qualquer apreciação literária, pois não estamos habilitados para tal.

Quem é o mestre Dinis?

Natural do concelho de Vila Franca do Campo, Dinis Furtado Brum, nasceu no dia 27 de junho de 1944, sendo filho de João Furtado Brum e de Maria da Glória Travassos.

Viveu, uma parte importante da sua vida, na rua da Cruz, na Ribeira Seca, onde trabalhou na oficina de ferrador de seu sogro, o mestre Viriato Madeira. Com a substituição dos animais na agricultura, a oficina de serrador deu lugar a uma serralharia, tendo o mestre Dinis feito um estágio na empresa Technal.

Como hobby, o mestre Dinis dedicou-se à música, tendo sido executante da Banda Lealdade e é um exímio cantador ao desafio conhecido em toda a ilha de São Miguel.

O livro serviu de pretexto para a escrita deste artigo tem por título “Um pouco da minha vida… com amizade e serenidade”, sendo essencialmente de carácter biográfico, apresenta, entre outros, também, dois capítulos de temática religiosa, um sobre a Vila e outro de cariz etnográfico.

Por razões de economia de espaço, apenas farei uma breve referência a alguns temas que mais me impressionaram enquanto criança, também residente na Ribeira Seca, e às artes e ofícios que, fruto do progresso técnico, desapareceram.

Em criança, algumas vezes dei uma escapadela de casa e fui ver o trabalho na oficina do mestre Viriato. Lá, o que mais me impressionava, talvez por não ser um trabalho tão rotineiro, era o trabalho na funda, onde eram colocadas ferraduras nos bois. Sobre este trabalho , o mestre Dinis escreveu:

“E o boi que trabalhava
Na carroça canga dura
Na funda se amarrava
Para pregar a ferradura”

No capítulo “Artes e Ofícios” há referência, entre outras, às seguintes profissões já desaparecidas: galocheiro, lenhador, arrieiro, barbeiro, cesteiro, tecedeira, albardeiro, moleiro, vendilhão de peixe.

Termino com uma quadra sobre o cesteiro:

“O animal que trabalhava
Para o dono ganhar o pão
Muita coisa transportava
Através do seu ceirão”

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31626, 18 de setembro de 2018, p.17)

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