Açores, 26 de abril de 1975
As plantas na medicina
popular segundo Urbano de Mendonça Dias (1878-1951)
Numa
consulta que fiz ao volume IV de “A Vila”, da autoria de Urbano de Mendonça
Dias, encontrei um muito interessante capítulo intitulado “Medicina Popular”. A
partir dele extrai apenas as informações relativas ao uso das plantas nos
tratamentos de diversos problemas de saúde, tendo atualizado os nomes
científicos.
Quem foi
Urbano de Mendonça Dias?
Foi
um jurista, pedagogo, escritor, etnógrafo e político conservador natural de
Vila Franca do Campo.
Foi
autor de diversos obras sobre a história dos Açores e cultura popular, de que
destacamos “A vida dos nossos avós - Estudos
etnográficos da vida açoriana através das suas leis gerais” e “A Vila
- Publicação Histórica de Vila Franca do Campo”.
Talvez a sua maior obra terá sido a fundação do
Instituto de Vila Franca, mais tarde designado Externato de Vila Franca do
Campo, responsável pela instrução de muitos vila-franquenses depois da então denominada
então escola primária.
As
plantas na medicina popular
A
casca da romã ou romãzeira (Punica granatum) quando tomada “em
jejum, durante nove dias seguidos, cura as bronquites asmáticas.”
Para curar a
tosse, são usadas várias plantas, como a salva (Salvia officinalis),
em infusão, tal como o limão (Citrus limon), a perpétua [pode
ser a perpétua-roxa (Gomphrena globosa)], a sempre-viva ou perpétua-silvestre
(Helichrysum luteoalbum), o suspiro-branco (Cephalaria leucanta) e o xarope de agrião (Barbarea verna) [poderá ser o agrião-de-água
(Nasturtium officinale)].
Com fins diuréticos,
são usadas infusões de folhas de salsa (Petroselium crispum) ou de
barbas de milho (Zea mays].
Para combater as dores
de barriga são usadas infusões de poejo (Mentha pulegium), de canela
(Cinnamomum
verum), a casca
da laranja-azeda (Citrus aurantium), urzela (Rocella
fuciformis) ou usai-dela (Chenopodium ambrosioides).
Para curar as dores de cabeça, são enumeradas algumas partes
de plantas ou frutos. Assim, um dos processos consiste “colocar uma casca de
limão nas fontes e na testa ou friccionar estas mesmas partes com vinagre ou
mostarda (Sinapis nigra) [Brassica nigra]”. Também pode ser, através
da considerada “a mais típica medicina da Ilha”, do seguinte modo: dispõe-se
“em cruz, sobre a cabeça, dous galhos de Arruda (Ructa bracteosa) [Ruta
chalepensis], tostados em brazas vivas, atando-se por sobre isto um lenço,
que pouco tempo depois as dores de cabeça terão desaparecido, graças a tão
inofensivo medicamento.”
Para estancar o sangue do nariz, esmagam-se folhas de salsa e
tapava-se a narina de onde provém a hemorragia.
No que diz respeito a problemas relacionados com o coração são
usadas infusões de folhas de laranjeira ou cascas de laranjas ou cidreira
(Melissa officinalis).
As dores de estômago são tratadas com infusões de flores de fel-da-terra
(Centaurium erythraea), de macela (Chamaeamelum nobile),
de agrimónia (Agrimonia eupatoria) ou de rainha-das-ervas (Tanacetum parthenium).
Para o tratamento de golpes, arranhões e eczemas é usada a
goma da espadana (Phormium tenax) ou o suco das folhas pisadas do
rabo-de-asno (Equisetum telmateia), do saião (Aeonium
arboreum) e do fel-da-terra (Centaurium erythraea). No tratamento
dos eczemas é usada a infusão de coquilho ou conteira (Canna indica).
Para a cura de hemorroidas e soltura [diarreia] é aconselhada
a infusão de folhas de araçazeiro (Psidium cattleianum), de erva-do-bom-pastor
(Capsella bursa-pastoris), de amoras, frutos da silva (Rubus ulmifolius)
ou banhos de fava-da-cova (Parietaria judaica).
A colocação de um pedaço de folha de couve (Brassica oleracea) sobre um furúnculo faz com que ele rebente.
Para combater a solitária é polvilhada uma talhada de abóbora-menina
(Cucurbita maxima) com açúcar, coloca-se no forno a assar e toma-se o
suco que vai destilando. Outro processo consiste em usar o cozimento das folhas
do feto-macho (Dryopteris filix-mas).
Entre os tratamentos para as dores de dentes, são referidos
os seguintes: bochechar a infusão de papoulas (Papaver sp.) e
receber vapores da infusão de alecrim (Rosmarinus officinalis).
No que diz respeito à inflamação da garganta um dos melhores
remédios consiste no “cozimento de malvas [Malva multiflora] em
água, ou melhor em leite, e gargarejado.
Contra as dores de ouvidos é aconselhado injetar no ouvido
suco de alho (Allium sativum) assado.
Para debelar as febres é usada uma infusão de avenca (Adiantum
capillus-veneris) ou de sabugueiro ou rosa-de-bem-fazer (Sambucus
nigra).
A erva-molarinha (Fumaria muralis) é empregada,
em infusão para amaciar a pele. Para tratar inflamações cutâneas usa-se o
cozimento de violetas-roxas (Saintpaulia ionantha?)
Para fazer crescer o cabelo aplica-se o suco de urtiga (Urtica
membranacea). Com mesmo fim, usa-se o cozimento de
folhas de nogueira (Juglans regia) que também tira a caspa.
As hemorragias uterinas são tratadas com infusões de erva-do-bom-pastor
(Capsella bursa-pastoris), de sempre-noiva (Polygonum
aviculare), de losna (Artemisia absinthium) ou de erva-sabina
(?)
Por último, para combater o reumatismo, são
aconselhadas fricções dos infusos de folhas de gigante (Acanthus
molis) ou de uma maceração de folhas de eucalipto (Eucalyptus
globulus) em álcool.
Bibliografia
Braga, T. (2023). As plantas na Medicina Popular nos Açores.
Ponta Delgada, Letras Lavadas.
Dias, U. (s/d). A Vila, volume IV. Ponta Delgada.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Urbano_de_Mendon%C3%A7a_Dias
https://www.worldfloraonline.org/
Virusaperiódico (64)
Neste
domingo, 29 de dezembro, para além de uma visita a Vila Franca do Campo, estive
a ler o livro de José Estêvam Pacheco de Melo intitulado “Sacrifício que
edifica: O legado de uma Vida em Vila Franca do Campo”.
Trata-se
não tenho dúvidas de um importante livro de memórias que é um contributo importante
para quem quiser aprofundar a história da nossa vila.
Não
tendo qualquer interesse nas tricas intrapartidárias, nem querendo discorrer
sobre as opções políticas, religiosas ou outras do professor José Estêvam, há assuntos
que ele aborda que merecem ser aprofundados por ele (será que terá paciência?)
ou por algum historiador que a partir destas memorias confrontasse-as com documentos
escritos e com depoimentos de outras pessoas que viveram alguns dos acontecimentos
relatados.
Uma
das questões que me marcou na minha juventude foi o da guerra colonial,
nomeadamente as mortes lá ocorridas. Lembro-me dos enterros do professor Emanuel,
seu irmão, de outro professor Emanuel, da Ribeira das Tainhas, que lecionou na
Escola da Ribeira Seca e de um jovem de sobrenome Santos que morava no Pico d’Él
Rei. Gostaria de ver tratado com mais profundidade o assunto e parece-que que
José Estêvam não põe de parte a vontade de o fazer.
Outra
questão que merece ser aprofundada e a merecer uma investigação profunda é a
abordada no capítulo “De comunista a fascista”.
Nos
últimos tempos tenho estado a estudar vários documentos existentes na Torre do
Tombo sobre as informações que a PIDE recolhia sobre a vida social e pessoal de
várias pessoas da nossa ilha e lido dezenas de livros e teses de doutoramento sobre
o Estado Novo e nunca detetei que as opções políticas dos cidadãos fossem
assinaladas nos documentos de identificação. Este tema merece ser aprofundado
com consulta aos arquivos da PIDE, em Lisboa.
Também
gostaria de conhecer a razão de José Estêvam ter sido considerado fascista
depois do 25 de Abril de 1974. Pelo que tenho pesquisado, em 1973, ele foi, presidente
da Comissão de Freguesia de Água d’Alto da ANP (o partido que substituiu a União
Nacional). Será esta a explicação? Que atividade desenvolveu no âmbito da ANP?
Quem o convidou para tal? (Faço estas questões porque meu pai fez parte de uma
comissão idêntica do então Lugar da Ribeira Seca e até hoje não tive qualquer resposta
às questões que levanto)
Com
a leitura do livro enriqueci os meus conhecimentos e faço um apelo para que
outros que trabalharam para o bem comum também escrevam as suas memórias.
Recomendo
a leitura do livro e fico à espera que o professor José Estêvam escreva outro
sobre a sua participação na guerra colonial.
29
de dezembro de 2024
João Inácio Botelho
António de Medeiros Rodrigues.
Para a história de Vila Franca do Campo.